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Religiões ayahuasqueiras: A interferência da política brasileira antidrogas

Este é um trecho entre arquivo dos seguintes autores:
Beatriz Caiuby Labate ... [et al.], (orgs.) . Drogas e cultura: novas perspectivas. - Salvador: EDUFBA, 2008. 440 p. : il.
Co-edição com: MinC, Fapesp, NEIP. Este livro é o resultado do Simpósio "Drogas: controvérsias e perspectivas", realizado na USP, em setembro de 2005.

Estigmas de grupos ayahuasqueiros

Por Sandra Lucia Goulart

Pretendo abordar o caso de grupos religiosos fundamentados no consumo ritual do chá psicoativo conhecido pelos nomes de Daime, Vegetal, Hoasca, Ayahuasca1, entre outros.
Seguindo uma abordagem histórica, mostro que, numa primeira fase, esses cultos eram acusados por diferentes setores da sociedade brasileira de práticas de “macumba”, “feitiçaria” e “curandeirismo”. Argumento que, atualmente, os estigmas sofridos pelas religiões designadas geralmente de ayahuasqueiras se transformaram. O uso do chá e as práticas rituais ligadas a ele passam a ser estigmatizados na medida em que são associados ao consumo de drogas. Em ambos os períodos, entretanto, estamos diante de grupos religiosos sob os quais paira a ameaça
constante da ilegalidade.
***
É o uso de um chá psicoativo – que recebe, como coloquei acima, denominações diversas, tais como ayahuasca, Daime e Vegetal – o elemento central de diferentes cultos religiosos surgidos na Amazônia brasileira a partir, principalmente, da década de 1930. Num determinado momento da história desses grupos, eles passam a ser identificados pela expressão religiões da ayahuasca ou ayahuasqueiras, sobretudo no âmbito externo desse universo religioso – na mídia, entre os estudiosos do tema, na sociedade em geral.
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Cronologicamente, a primeira religião ayahuasqueira brasileira é aquela que ficou conhecida como Santo Daime, criada por Raimundo Irineu Serra, o Mestre Irineu, no início dos anos trinta, em Rio Branco, Acre. O termo Daime, que serve de nome tanto ao culto quanto a bebida aí utilizada, segundo estes religiosos, relaciona-se às invocações feitas ao ser espiritual que habita o chá. Assim, “Dai-me” é um pedido feito por quem consome o chá ao próprio chá: “dai-me saúde, dai-me amor, dai-me luz”, etc.2 Em 1945, surge outra religião ayahuasqueira, também em Rio Branco, criada por Daniel Pereira de Mattos, o Mestre Daniel. Inicialmente, o culto do Mestre Daniel era conhecido em Rio Branco como “Capelinha de São Francisco”, nome dado a humilde construção de taipa, situada numa região rural, onde ele começou a realizar “trabalhos espirituais” usando o chá. 

Novas acusações: o daime como droga

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Na região amazônica do Brasil, e em particular em Rio Branco – berço das religiões ayahuasqueiras –, o cenário institucional repressivo com relação às drogas ilícitas, de um modo geral, também passa a sofrer alterações a partir da década de setenta. Assim, em meados dos anos setenta verificamos as primeiras iniciativas mais contundentes do governo brasileiro com relação ao combate às drogas ou ao narcotráfico na Amazônia. É o que demonstram uma série de tratados realizados, nesta época, entre o Brasil e outros países amazônicos, como o Peru, a Venezuela e a Bolívia. Como coloca Rodrigues (2002), estes tratados visavam unir os esforços de países amazônicos vizinhos na repressão ao uso e, sobretudo, ao tráfico (às suas rotas) de drogas ilícitas, expressando o início do alinhamento entre a política brasileira antidrogas e a repressão internacional ao narcotráfico. Também é importante salientar que a Polícia Federal apenas se instala na capital acreana em 1973, estando até então ausente na região (Mortimer, 2000; Goulart, 2004a).

As relações entre os cultos ayahuasqueiros e instituições governamentais são afetadas por esses esforços iniciais do governo brasileiro no que se refere à repressão às drogas ilícitas na região amazônica. Um ano depois de se instalar no Acre, em 1974, a Polícia Federal já manifesta interesse em investigar os grupos religiosos ayahuasqueiros locais, convocando os dirigentes de vários destes grupos para depoimentos informais. Como vimos, esse tipo de ação não constituía novidade na rotina destas religiões. Ao contrário, o próprio Mestre Irineu e os fiéis de seu centro, nos anos trinta e quarenta, eram, com freqüência, chamados e inquiridos por policiais, delegados ou seus representantes, e suas residências e locais de culto invadidas por essas autoridades oficiais. Contudo, estas novas investidas da Polícia Federal, na década de setenta, se distinguiam daquelas do passado porque o objetivo não era mais reprimir crenças de “macumba” e “feitiçaria” ou, então, combater práticas terapêuticas populares que se enquadrassem na categoria de atos de charlatanismo e curandeirismo. O interesse principal dos representantes da lei passava ser a bebida consumida em todos esses cultos. Como relatam vários adeptos dos diferentes grupos que foram chamados, em 1974, para uma “conversa” com o delegado da Polícia Federal (PF), as informações solicitadas diziam respeito aos efeitos do chá, a suas conseqüências, sua composição etc. Era a decocção, vista em si mesma, como substância, isto é, como droga, que despertava curiosidade e desconfiança, muito mais do que um conjunto amplo de práticas religiosas ou fitoterapêuticas.
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Muitos destes novos temas destacados tanto em acusações ou denúncias quanto em resoluções do governo, nos anos de 1990, estão diretamente relacionados à expansão de algumas destas religiões. Conforme muitas delas ganham visibilidade, ao passarem a contar com uma quantidade crescente de grupos não só em várias regiões do Brasil, mas inclusive em outros países, mais todos estes cultos têm sua imagem associada ao tema de drogas ou tóxicos. Nesse sentido, uma polêmica que se torna cada vez mais freqüente é a da “comercialização” ou do “tráfico” da ayahuasca.
Neste caso, também, as queixas vêm, principalmente, do próprio campo ayahuasqueiro, e implicam em acusações de “venda” do chá, “turismo” religioso ou uso do chá para “fins não religiosos”. Esse tipo de acusação aumenta na medida em que se torna mais expressivo o crescimento de religiões ayahuasqueiras no exterior. Dois eventos ocorridos, em 1999 e 2000, envolvendo justamente as duas religiões ayahuasqueiras mais comprometidas com um movimento de expansão, a UDV e o CEFLURIS, levaram a um destaque ainda maior, nesse campo, de acusações de “tráfico” do chá. Em 1999, alguns litros de Vegetal foram apreendidos pela polícia da Califórnia. Em  2000, na Espanha, alguns dirigentes do CEFLURIS, que entravam neste país trazendo Daime para suas igrejas filiais, aí estabelecidas, foram presos em flagrante, sob a acusação de tráfico de droga (Groisman, 2000; Ribeiro, 2005).
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Em 2001, a Secretaria Nacional Antidrogas (SENAD),31 em parceria com a Polícia Federal e o Ministério da Educação, elaborou um questionário de setenta e quatro perguntas dirigidas às entidades religiosas brasileiras usuárias da ayahuasca. Além da recorrência às noções de “droga”, “tóxico”, “alucinógeno”, e de uma visão tendenciosa, que já pressupunha uma dependência causada pelo chá (Goulart, 2004a; Labate, 2005), as perguntas deste questionário expressavam uma inquietação sobre questões como a “exportação” da ayahuasca para outros países, ou com as formas assumidas por seu consumo fora de situações “rituais” ou fora da “tradição” brasileira.

Algumas considerações finais
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Hoje em dia, também, de modo diferente do que ocorria no passado, os estigmas sofridos por esses cultos não parecem mais vincular-se, diretamente, à repressão de grupos socialmente desfavorecidos. Afinal, seus adeptos provêem de diversas classes sociais e, quanto maior é a expansão desses grupos, mais alta parece ser a classe social de seus fiéis, como se dá, aliás, com os grupos do CEFLURIS e da União do Vegetal no exterior. Neste caso, o estigma e a marginalidade estão mais relacionados a estilos de vida desviantes daqueles dominantes em uma sociedade (Velho, 1998) do que a discriminações de raça ou de classes sociais.

Um comentário:

  1. Bem loco esse blog hein!https://capricornuscruentum.blogspot.com/logout?d=https://www.blogger.com/logout-redirect.g?blogID%3D733087070618471265%26postID%3D4027754447886306563

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