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TUPINAMBÁ - A antropofagia e a troca dos mortos

Fleischmann et al. (1994) cita que os Tupinambá eram um subgrupo dos povos Tupi, desapareceram em fins do século XVI das regiões que eles habitavam, a costa dos atuais estados da Bahia, do Rio de Janeiro e São Paulo. O canibalismo então no Brasil é mencionado pela primeira vez no terceiro relato de Américo Vespúcio, as cartas de Vespúcio eram a leitura predileta no século XVI,e através delas constituia uma imagem do Brasil como "terra de canibais". O mapa do Brasil de 1503-4, conhecido como Kunstmann II, já ostenta como ilustração principal um índio assando um branco num espeto sobre brasas (ver abaixo na imagem). Apesar disso não houve nenhum relado a respeito nas décadas seguintes... O autor ao final diz que, Léry transparece em um curto trecho como deve ter sido o encontro entre Tupinamba (selvagens) e Europeus (civilizados): "aqueles, um povo ameaçado de escravidão, já marcado pela sua extinção próxima, estes, os Europeus, homens que devido a medos e fadigas encontravam-se em uma situação psíquica extrema, propensos a ver coisas que não existiam." Equívocos que podem ter consolidado seja porque, Anchieta desejava uma morte de mártir, ou porque simplesmente desejavam escrever um livro interessante para vender. 
Essa é uma versão de alguns autores, de que os Tupinambás não eram tudo o que contavam. Agora, outra versão...
Carta portulana: As primeiras cartas marítimas foram produzidas no fim do século XIII, início do século XIV. Seu objetivo principal era retratar com a maior precisão possível os litorais e os portos, [...] eles registravam as novas descobertas nas cartas marítimas. Entre as descobertas de Vespúcio na América do Sul estão a costa norte que vai de De Lisleo (San Lorenzo, Lago de Maracaibo) ao Rio de le Aues (rio Orinoco), e a costa leste do continente, depois do território entre o Cabo de São Roque e o Rio de Cananor. Neste mapa a faixa costeira do sul é identificada como “Terra Sanctae Crucis”. Uma inscrição e uma imagem no canto esquerdo inferior relatam a prevalência de canibalismo na região (wdl.org).

Outros olhares sobre o xamanismo tupinambá

"Apesar da multiplicidade de tribos, os índios da costa brasileira formavam um círculo cultural relativamente fechado. (...) Como entre todas as tribos sul-americanas, as concepções religiosas dos Tupi estavam dominadas pelo animismo e o xamanismo. O xamã, feiticeiro ou curandeiro, representava um papel central em todas as manifestações da vida de um grupo. Na sua qualidade de mediador das forças sobrenaturais era igualmente respeitado e temido. Não o cacique, mas o pajé era quem exercitava propriamente o poder sobre uma linhagem ou uma aldeia. Por ocasião de catástrofes, doenças, ritos de caça e acontecimentos semelhantes, devia apaziguar as forças invisíveis. Eram venerados os espíritos da natureza e dos ancestrais: contudo, os Tupi criam também num ser superior. Os missionários cristãos apropriaram-se dessa sua concepção religiosa, apresentando aos indígenas o Deus cristão como "Pai-Tupã".
"O canibalismo era conhecido entre todas as tribos índias da costa, sobretudo entre os Tupimambá, com a possível exceção das tribos meridionais dos Guaianaz e dos Carijó. A guerra tinha grande importância na vida dos indígenas. Os Tupi não só se encontravam num estado de inimizade permanente com as tribos do interior, mas combatiam-se também uns aos outros. Os Caeté e os Tupinambá da costa central do Brasil tinham fama de ser os guerreiros mais capazes e cruéis. Canibalismo e gosto pela guerra condicionavam-se mutuamente, porque os indígenas, não raramente, atacavam os seus inimigos com a finalidade de procurar vítimas para as festas canibalescas". 
(M C Bingemer et al., 2007).

A guerra pode ser considerada como "condição necessária" do processo de diferenciação social mediante a rotinização do carisma com relação ao acesso às atividades xamanísticas. Com isso, não é pretendido afirmar que os bem-sucedidos na guerra se transformam em Pajés.
Talvez canibalismo entre algumas tribos não seria condição necessária para ser Pajé, mas sim "a aquisição do carisma por intermédio da guerra e do sacrifício ritual representava uma condição básica do xamanismo"
O esquema de posições sociais e o desenvolvimento da carreira social entre os tupimambá excluíam a possibilidade de ascensão direta ao status de pajé e ao exercício das atividades xamanísticas.
Todavia, a importância da guerra da vida pessoa dos pajés era naturalmente variável; Pelo que se pode presumir, admitindo-se que todas possuíam um grau mínimo de qualidades de ajustamento indispensáveis, o xamanismo atraía três categorias de pessoas:
a) as que eram bem-sucedidas como guerreiros e "matadores" (isto é, sacrificantes), as quais praticavam o xamanismo como uma fonte suplementar de carisma;
b) as que encontravam nas atividades xamanísticas uma modalidade de compensação na acumulação do carisma
c) e as que se dedicavam a essas atividades em virtude da própria capacidade de lidar com o sagrado.
E o que acontece na forma assumida pelo xamanismo na sociedade tupinambá?
A guerra era uma "condição" para o acesso ao xamanismo deles. Como se vê duas eram as fontes de carisma e de diferenciação social com base nos dotes carismáticos: o sacrifício humano e o xamanismo. A guerra contribuía para configurar a estrutura social e o seu ritmo de funcionamento na sociedade tupinambá, através do sacrifício humano.
O canibalismo tupinambá tinha uma função religiosa:a de promover uma modalidade coletiva de comunhão direta e imediata com o sagrado.
Thevet, encontra na raiz do canibalismo tupinambá um elemento educativo: para que os jovens agissem como deviam na guerra era preciso que tivessem plena segurança de que sua morte seria "vingada", e que aspirassem a essa espécie de distinção por parte dos companheiros.
Também pode-se dizer que, colocar o canibalismo tupinambá entre as modalidades de canibalismo mágico como: a ingestão de carne humana representava um meio de captação de energias. De outro, a expressão coletiva dessas ações assumia uma função mágico-religiosa, pois poderia assim destruir o "suporte orgânico" da "alma imortal".
Os ritos de purificação, ou de renovação, transcorriam simultaneamente aos de antropofagia. 
(FERNANDES, 2006).

O casal Clastres buscavam a Terra sem Mal como efeito da colonização, sendo uma "recusa ativa da sociedade" indígena (CLASTRES, H. 1978, p. 68 apud COUTO, 2013) a Terra sem Mal seria a felicidade divina, e condenavam à morte da estrutura da sociedade e so seu sistema de normas no interior da própria sociedade indígena onde o "xamanismo desaparece no profetismo e o profetismo numa antropologia política." [...] as migrações foram resultantes unicamente vinculadas às tensões internas da sociedade Tupinambá, contra o surgimento do poder político (o "Estado") entre as várias comunidades indígenas, surgindo profetas errantes que estimularam a descentralização do grupo. 
Assim,a proposta de "cristianização do imaginário indígena" ou a "indigenização do sobrenatural cristão" onde havia conteúdos e elementos apresentados pelos jesuítas foram absorvidos pela cultura indígena porque se inseriam num preciso contexto significativo, isto é, faziam sentido, mas, em ordem reversa, causou desconfiança em relação ao significado de "conquista espiritual" em uma visão da construção negociada atribuída aos missionários jesuítas.
Finalmente.... é provável que a Mitologia Tupinambá e dos "Tapuias" com as suas manifestações ritualísticas e de culto tenham sido mais amplas com outros aspecto e e elementos que passaram despercebidos, incompreendidos, ou então não foram valorizados pelos cronistas que, mesmo com nacionalidades distintas tinham formação cristã, pois tratavam-se de padres jesuítas, um francês católico e outro protestante calvinista e um arcabuzeiro alemão.
(COUTO, 2013).


Referências:
COUTO, Ronaldo. Manifestações Culturais Dos Tupinambás no Brasil Colonial. Rio de Janeiro, RJ: Ed. do Autor, 2013.
FERNANDES, Florestan. A função social da guerra na sociedade tupinambá. 3 Ed. São Paulo: Globo, 2006.
FLEISCHMANN, Ulrich; ASSUNÇAO, Mathias Rohrig; ZIEBELL-WENDT, Zinka. Os Tupinambá: realidade e ficção nos relatos quinhentistas. Penélope: revista de história e ciências sociais, n. 14, p. 23-41, 1994.
Maria Clara L. Bingemer. Inácio Neutzling SJ. João A. Mac Dowell SJ. A Globalização e os Jesuítas: origens, história e impactos. 1 ed. São Paulo: Edições Loyola, 2007.

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