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AVÔHAI: O início psicodélico de Zé Ramalho

José Ramalho Neto passou a maior parte  de sua adolescência e de onde saiu para o Rio de Janeiro em busca de reconhecimento, e conseguiu em 1978 através do lançamento de seu primeiro álbum. Melo (2015) cita que encantou-se ao ouvir pela primeira vez sua voz cantando uma letra meio incompreensível com uma simples harmonia, ao mesmo tempo rebuscada por instrumentos característicos. Segundo Florencia Garramuño, no livro "Frutos estranhos", funda uma poesia em que [...] sua expressão mínima, pode-se falar - e até quase constantemente - de emoções e sentidos, de sensações e sentimentos, ainda que sem sentimentalismo" (GARRAMUÑO, 2014, P. 62 apud DE SOUZA MELO, 2015).

Agora, pessoalmente falando,  certas músicas são inexplicáveis, de emoções e sentidos, por vezes nostálgico, remete o passado extremamente nostálgico, que retratam muitas vezes o interior da capital onde moravam para os mais velhos, e uma sensação de sonhos em um futuro aos mais novos... 
Músicas como por exemplo de Alceu Valenca  "La Belle de Jour girassol" e "Anunciação", ou de Geraldo Azevedo "Dona da minha cabeça"... Se você for olhar a playlist do blog, vai encontrar duas músicas citadas aqui.


Mas foi então "AVOHAI"... 
Nesse início da década de 70, Zé Ramalho saiu pelas cidades do interior pesquisando a música e à poesia nordestina, aquela que ouvia quando pequeno e voltou a escutar nos encontros com violeiros, emboladores, cantadores, aboiadores, cordelistas e repentistas. Aprofundou seus treinos em violas do sertão e virou especialista em escrever histórias de cordel, compor em forma de trova e misturar estilos. Após abandonar a faculdade de medicina, comungou com a psicodelia: LSD e chá de cogumelo serviram de combustível para a saída de sua primeira leva de músicas, entre elas “Avôhai”.
Segundo Zé Ramalho, “Avôhai” surgiu durante uma experiência lisérgica em que vozes sopraram os versos, entre eles “Avôhai, avô e pai”. Zé perdeu seu pai com menos de três anos e foi criado pelo avô, um homem forte do sertão da Paraíba, espelho do músico paraibano até sua morte, em 1976, dois anos antes do neto alçar fama nacional. 
Contando com tantas influências e tão diversificadas referências, em princípio, a construção elaborada por Zé Ramalho parece possuir uma identidade própria. 

Teles (2001) agora descreve:
"Ao recordar esse momento vivido da década de 70, numa entrevista ao jornalista pernambucano José Teles, o compositor Zé Ramalho afirmou que vivia-se um "intuito muito psicodélico" em tudo que se fazia, vivia-se uma "situação psicodélica" onde muitas destas expressões artísticas eram atravessadas pelo encontro destes jovens com suas primeiras experiências com LSD ou com cogumelos alucinógenos"

O Universo da Cantoria de Zé Ramalho

Devido à dimensão visionária e psicodélica de suas canções, o cantor paraibano acabou conseguindo um espaço neste selo, O disco estava repleto de composições suas que trazia na bagagem, desde suas vivências em João Pessoa e Recife, anos antes. Vivências que foram agenciadas nos territórios existenciais das experimentações so desbunde, como relembrou o próprio autor em uma entrevista:
Estas músicas já vinham sendo tocadas em suas apresentações na Paraíba, em Recife e também no eixo Rio-São Paulo, quando trabalho como música da banda de Alceu Valença. Antes dele, ganharam projeção no universo musical nacional os cearenses Ednardo, Fagner e Belchior, além dos compositores Geraldo Azevedo e do próprio Alceu Valença.

Psychedelic nature http://ynnat.tumblr.com

Um pouco mais sobre alucinógenos ...

A redescoberta do potencial extático da psilocibina, substância contida em certas espécies de cogumelos, e a recente invenção do ácido lisérgico, foram dois acontecimentos importantes que geraram deslocamentos tanto no campo das ciências quanto nos territórios existenciais da contracultura ao redor do mundo. A possibilidade de  uma expansão momentânea da consciência e da sensibilidade, os deslocamentos no campo da percepção, a vontade de ir a fundo dentro de si mesmo e sentir o mundo ao redor de outra forma, dentre outras coisas, estimularam a criação de novas relações culturais [...]. Também houveram as bad trips, as viagens sem volta, aqueles que literalmente piraram. [claro, na maioria a dose foi maior do que recomendado].
Eliade, que consideram a ingestão de cogumelos como uma prática cultural bastante antiga na história da humanidade e que teve fundamental importância para a construção dos territórios existenciais e das cosmogonias de uma série de povos nativos, que faziam uso de cogumelos à base de Psilocibina em suas experiências ligados ao xamanismo. O fato é que as tradições xamânicas foram perseguida pelo ideários cristão dos colonizadores europeus, que as consideravam "diabólicas" bem como outras relações que os povos ameríndios estabeleciam com a natureza. Mesmo com mais de 500 anos de colonialismo e europeização do continente que passou a se chamar Americano, as práticas xamânicas sobrevieram até os dias de hoje, junto as populações nativas que mantiveram dentre outras a tradição asteca do teonanacatl. Essa tradição de uso ritual de cogumelos alucinógenos, havia ficado conhecida entre os brancos, após a publicação de um frade do século XVI, que viveu grande parte de sua vida nas terras colonizadas e escreveu a obra "Historia General de las Cosas de Nueva Espana". Só partir dos anos 50 do século XX estas práticas passaram a ganhar um novo regime de inteligibidade para o pensamento ocidental, sobretudo através das pesquisas de Gordon e Valentina Wasson, que inauguram um amplo campo de debates e experiências em torno desta substância psicoativa. Neste sentido ver as obras: MCKENNA, Terence. O Retorno à cultura arcaica. Rio de Janeiro: Editorial Record, 1991. MCKENNA, Terence. O alimento dos deuses. Rio de Janeiro: Editora Record, 1995. ELIADE, Mircea. O xamanismo e as técnicas arcaicas do êxtase. São Paulo: Martins fontes, 1998.

Referências:
DE SOUZA MELO, Christina Fuscaldo. Baseada em Fatos Reais-Zé Ramalho, Eu e a Escrita (Auto) biográfica. XXXVIII Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Rio de Janeiro, RJ – 4 a 7/9/2015.
TELES, José. Do frevo ao Manguebeat. São Paulo: editora 34, 2001.

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